quarta-feira, 20 de março de 2019

Isso se chama femimimiminismo

Ao fim da leitura de cada edição da revista Veja, me questiono: por que teimo em manter a assinatura dessa porcaria? Tive de pagar para ler, no ano passado, uma reportagem sobre Pabllo Vitar, com direito a foto sua de calcinha... Senti nojo, não li; e então joguei dinheiro fora. Mais recentemente, uma reportagem sobre funk paulista, que eu li, embora o assunto passe ao largo dos meus interesses culturais. Algum assinante de Veja, alguém disposto a abrir mão mensalmente de uns R$100,00 se interessa por coisas desse tipo?

Hoje, o sr. J. R. Guzzo tem sido o único colunista decente dessa revista, assim como o foi Diogo Mainardi nas décadas de 2000 e 2010. Quase todos os demais se rendem, com gostosa submissão masoquista,  ao mimimismo - a nova onda do pensamento preguiçoso ocidental. O mimimi os oprime, e eles urram de prazer.

Uma das colunistas mulheres do hebdomadário publicou, em edição deste mês, texto no qual destaca a sofisticação psicológica da protagonista de um filme dirigido por uma mulher. Constatando a raridade desse tratamento artístico voltado para uma personagem feminina, o que conclui e pelo que clama a colunista femimimiminista? Isso decorre do fato de haver poucas mulheres cineastas... logo, é preciso haver mais mulheres na função de diretoras cinematográficas. E assim teremos mais personagens femininas construídas à imagem e semelhança das próprias mulheres.

Sim; eu estou pagando caro para, em minhas leituras quase sempre integrais da Veja, acompanhar raciocínios desse tipo barato.

Primeiro: o clichê de Simone de Beauvoir - "ninguém nasce mulher; torna-se mulher" - tenta escapar de uma ideia engessada de identidade para se acomodar em outra tão engessada quanto. Afinal, a célebre máxima preserva uma essência feminina ("ser mulher é isso, viu, gente!"), essência que as mulheres devem alcançar, sob risco de nunca serem mulheres de verdade. Aconselho à colunista de Veja ler Stuart Hall, que ensina sabiamente que toda e qualquer identidade é um devir...

Segundo: não detectei nenhuma complexidade psicológica digna de nota na construção da super-heroína Mulher Maravilha, personagem de filme dirigido por uma mulher. Rambo, protagonista machão de filmes dirigidos por homens, também não ostenta nada além de brucutice. Uma grande amiga minha, - a propósito, feminista -, identificou-se bastante com a protagonista de Amélie Poulain, filme dirigido por um homem. Canções de Chico Buarque, um compositor masculino, assumem vozes femininas de modo a despertar a inveja em muitas cantoras e poetisas.

Terceiro: mesmo que a identidade feminina fosse uma essência ("nós, mulheres, somos psicologicamente muito mais complexas do que como somos habitualmente retratadas no cinema")... o que a arte tem a ver com isso? Por estilo, por escolha, por incompetência, por qual motivo for, o artista cria sua personagem livremente, seja de modo pretensamente realista, seja de modo caricato, seja... seja... Há gêneros de filme que comportam complexidade psicológica; em outros, esse ingrediente pode comprometer completamente a estrutura da narrativa fílmica.

Quarto: exigir e garantir cotas no setor artístico... isso é viável? isso é sensato? Numa universidade, o número de vagas para estudantes é, digamos, 30 mil. Numa empresa, o número necessário de funcionários é, vamos lá, 60. Tais setores permitem a implementação de política de cotas para mulheres, para negros, para deficientes físicos etc. Mas em matéria de arte... Podemos hoje ter um único gênio na pintura ou dois ou três ou quatro... ou nenhum. Quem decretará o número de vagas para diretores de cinema no mundo? A colunista da Veja?

Efetivo e produtivo feminismo para mim se chama Angela Merkel, cuja atuação política massacra qualquer machismo e abafa todo femimimiminismo.

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