sexta-feira, 27 de maio de 2016

É goooooolllll? Ou é gooooollllpe?

Um humorista teve a hilária e brilhante ideia de noticiar acontecimentos sobretudo relacionados com a Operação Lava Jato (o certo é "Lava a Jato", não?), como se estivesse narrando um jogo de futebol na rádio. Ficou perfeito, e por isso mesmo muito engraçado, o encaixe da dinâmica esportiva na dinâmica política, jurídica e policial que tem praticamente monopolizado as atenções da imprensa brasileira. A sacada merece mais do que risos; merece também aplausos, por ter captado um fenômeno não inédito, nem recente, tampouco incomum no Brasil, mas que tomou uma evidência assombrosa nestes últimos anos: a futebolização da política.

De um lado, a torcida uniformizada de verde e amarelo (é jogo da Seleção Brasileira?). Do outro lado, a torcida uniformizada de vermelho (é jogo do Internacional? ou da Internacional?). O plenário do Senado aprova o afastamento da presidente da República, um lado grita e solta fogos de artifício. O ministro do Planejamento cai, o outro lado comemora como um cartão rubro de felicidade que expulsa um jogador do time adversário. Teori Zavascki retira de Curitiba as investigações a respeito de ex-presidente, um lado entoa "juiz ladrão, porrada é solução". Teori Zavascki determina acréscimo de documentação que incrementa denúncia contra o mesmo ex-presidente, o outro lado repete o lisonjeiro e ponderado dístico.

No entanto, apesar dos inegáveis riscos e preocupantes indícios que essa maneira de se participar e de se pensar a política acarreta, a futebolização da política não consiste num mal em si. A depender do seu aproveitamento - infelizmente, improvável -, o fenômeno se revelaria uma caixinha de surpresas de onde se poderia tirar algumas boas lições. Pois mesmo um cruzeirense fanático, um flamenguista doente, um corintiano sofredor e um atleticano atleticano não poupam críticas a seus respectivos times, se estes jogam mal ou realizam uma campanha pífia. Os torcedores têm, sim, seus ídolos, heróis de notórios feitos que marcam a história de um clube. Mas não há craque que sobreviva a uma má fase sem se tornar alvo da contrariedade e da impaciência dos que vão aos estádios, vestidos das cores do clube.

A futebolização da política também poderia nos ensinar que o amor ao time não supera, pela lógica, pela coerência jamais superará, em grandeza, o amor ao futebol. Nesse caso, não há sequer farelo de dilema em relação a quem cabe a antecedência, se ao ovo (o time), se à galinha (o esporte). Sendo assim, a adesão ao partido não deveria nunca superar, em grandeza, o interesse no funcionamento democrático da política e no que for considerado melhor para o País. Trata-se do velho tema de reconhecer a importância da existência do outro. Nenhum time pode jogar a não ser contra algum adversário, eis a essência de qualquer esporte. Ademais, o que seria da história do Atlético Paranaense sem o Paraná? do Fortaleza sem o Ceará? do Bahia sem o Vitória?

Contudo, o cidadão e eleitor brasileiro teima em preferir aprender, para aplicá-las à política, as piores lições futebolísticas. Comemorando a vitória decorrida de um pênalti mal marcado, de um gol impedido. Vibrando com as várias opções de injustiça que enfeiam o esporte, mas que, uma vez e outra, favorecem o clube para o qual torce. O futebol malandro, pós-graduado em jeitinho, é o modelo da nossa política malandra. E como se não bastasse, a incompetência e a má administração também já se estabeleceram, há muito, como modelo para a política do elefante geográfico de chuteiras que é o Brasil.



 

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